quinta-feira, 23 de maio de 2013

Um ‘não’ que pode custar caro


Edu: O Santos disse 'não'... Mas não é um simples 'não'. O Barça até aumentou em 4 milhões a oferta por Neymar (total de 22 milhões de euros só pelos 55% que pertencem ao Santos), só que uma série de informações e argumentações paralelas levaram o Comitê Gestor do clube a esnobar a proposta catalã.
Carles: E essas informações são…?
Edu: Todas vieram daí. Por exemplo, teve um impacto forte sobre os dirigentes a notícia de que o Manchester United vai pagar 18 milhões de euros por Thiago Alcântara, um reserva hoje sem muito prestígio no Barça. A Globo fez propaganda desse negócio e virou a cabeça da moçada santista. Outra notícia: o Madrid pediu à Juve 30 milhões por Higuain, um meio-reserva. Coisas assim são suficientes para despertar uma reação irada contra o velho complexo de vira-latas nos cartolas brasileiros: 'Se Thiago e Higuain valem isso, quanto podemos conseguir por Neymar?'
Carles: Já era de se esperar que o clube santista não resistisse a abrir um leilão. Talvez o desespero pelas dívidas tenha conseguido alimentar momentaneamente a ideia de que a oferta do Barça pudesse ser aceita. Por aqui se fala em 100 milhões do Real Madrid e de 136 milhões do City. Imagino que esses números também chegam por aí, não? E tem mais, os preços dos passes de Thiago e Higuain estão relacionadas com as cláusulas contratuais, no caso do hispano-brasileiro, um descuido (ele não cumpriu o número de minutos mínimos, necessários para manter a blindagem original) baixou essa cláusula de 90 milhões a 18 milhões. E o United não brinca em serviço. Se bem que também se fala do interesse do Bayern, de Pep, concretamente.
Edu: Os números não só chegaram aqui como são usados abertamente na mesa de negociação. Ao comunicar que o Santos rejeitava a proposta, o vice-presidente ressaltou que também estavam em discussão ofertas como a de Florentino. Só que algumas posições nem tão explícitas, de ambos os lados, não são compreendidas numa ação de mercado que envolve duas culturas esportivas que não batem. Ao Santos, pouco importa que o Barça não queira participar de um leilão. O clube aposta nos quase três meses que ainda terá até o fim da janela de transferências para a Europa. Só não enxerga que aí pode estar a razão do grande fracasso: Neymar quer o Barça e só o Barça. Ou fica até o ano que vem e o Santos não leva um tostão.
Carles: Como já cometamos no outro dia, a proposta do Florentino pode ser a mais interessante para os especuladores, donos de parte do passe, enquanto para Neymar, além da motivação que possa ter jogar no Barça e não se expor ao ambiente normalmente pesado do clube da capital, os números oferecidos pelo Real Madrid podem ser uma grande mentira. No Barça ele tem direito aos ganhos integrais referentes à exploração da própria imagem. Já no Madrid, esses rendimentos são repartidos meio a meio. Com Beckham, por exemplo, Florentino recuperou o investimento da contratação só com a venda de camisetas em alguns meses. Com Neymar, as previsões são de que isso aconteceria no prazo de 3 ou 4 meses. Se vier antes do verão, a tradicional turnê asiática já valeria para amortizar grande parte do investimento. Pouco importa se o garoto vai estar infeliz e seu rendimento vai ser baixo. Exemplos disso não faltam.
Edu: Acontece, Carlão, que quem está negociando em primeiro plano é o Santos, que não dá a menor importância para o futuro do Neymar, essa é a verdade. Acertada a venda, adeus, a fila anda e vamos pagar as dívidas. O que fica claro neste momento, porém, é essa falta de sensibilidade dos caras para negociar com a faca no pescoço. Hoje, o Santos, que saiu todo orgulhoso da reunião por ter dito um sonoro 'não' ao Barça, está na verdade em situação complicadíssima porque pode ficar sem a grana ‘culé’, mas também sem nada daqui a dois meses porque se Neymar pai e Neymar Júnior não quiserem, não há City e Florentino que os convençam. Arrisco dizer que dificilmente o Barça fechará este negócio se a coisa se prolongar além desta semana. Isso, se já não desistiu e só vamos ficar sabendo em algumas horas.
Carles: Esse orgulho pelo ‘não’ é que denota o complexo de vira-latas e essa, definitivamente, não é a base de bons negócios e muito menos de um futuro à altura de Neymar no futebol europeu. Florentino marcou as eleições no clube para 16 de junho e só a estratégia de atrapalhar o negócio do rival, esse ‘não’ de hoje pode garantir não ter um só candidato oponente no pleito.
Edu: Para você ver como alguns caras aqui são obtusos. Se fossem minimamente habilidosos teriam distribuído um comunicado elegante, dizendo que as negociações caminham normalmente, mas que não houve ainda acordo. De quebra, poderiam elogiar os dirigentes do Barça e esclarecer que todas as partes estão buscando a melhor solução. Nada mais básico do que isso como demonstração de bons modos. Mas não. Quiseram jogar para a galera. Agora que segurem o rojão. Enquanto isso, Neymar vai continuar em campo, dividido, tenso e preocupado. Que valorização eles esperam dessa situação?
Carles: Você está pedindo muito. Esse "saber estar" é coisa rara, o dirigente marrudo, que peita todo aquele que se aproxima do patrimônio do clube, continua sendo digno de admiração. Engana-se quem pensa assim de quem está se promovendo às custas de meninos talentosos e mal orientados. No fim eles vão conseguir o que querem, tumulto e briga de foice para aumentar uma quirelinha no troco deles, mas a que preço para o centro de tudo isso. Para Neymar a linha entre o sucesso e o fracasso na Europa segue sendo tênue e a cada esbravejada desses senhores a pressão sobre ele aumenta.
Edu: Uma estupidez coletiva monumental, porque ninguém sai ganhando. A torcida não vai suportar um Neymar à meia força, os clubes saem ambos derrotados - o Barça para manter seus princípios e o Santos orgulhoso e sem um tostão - e o jogador e seu staff só terão um imenso desgaste para administrar daqui por diante. Só mesmo se o Florentino lucrar alguma coisa, como sempre.

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